Prof. Alexandre César
Instruções para esta prova:
―Conteúdo: Fonologia e Implícitos (capítulo 2 e 3); Classes Gramaticais:
Conjunção e Preposição (capítulo 5, 9 e 14);
―Evite rasuras, abreviações e linguagem coloquial;
―Questões respondidas a lápis, rasuradas ou modificadas com corretivo líquido
não terão direito à revisão de nota;
―As respostas devem ser construídas com texto; as referências “em linhas” às
questões correspondem a uma sugestão quanto ao número de linhas da
resposta. Portanto, é variável a quantidade de linha, mas não suprimível o
formato textual das respostas;
―Faça letra legível e procure organizar o texto;
― Salve e boa prova para vocês!!
Texto 1 para as questões.
A flauta que me roubaram
Cassiano Ricardo
Era em São José dos Campos.
E quando caía a ponte
Eu passava o Paraíba
Numa vagarosa balsa
Como se dançasse valsa.
O horizonte estava perto.
A manhã não era falsa
Como a da cidade grande.
Tudo era um caminho aberto.
Era em São José dos Campos
No tempo em que não havia
Comunismo nem facismo
Pra nos tirarem o sono.
Só havia pirilampos
Imitando o céu nos campos.
Tudo parecia certo.
O horizonte estava perto.
Havia erros nos votos
Mas a soma estava certa.
Deus escrevia direito
Por pequenas ruas tortas.
A mesa era sempre lauta.
Misto de sabiá e humano
O meu vizinho acordava
Tranqüilo, tocando flauta.
Era em São José dos Campos.
O horizonte estava perto.
Tudo parecia certo
Admiravelmente certo.
Lauta: exuberante, farta, grandiosa.
Texto 2 - Agora, leia este trecho de um discurso do próprio Cassiano Ricardo sobre o poema acima:
“(...)o “Martin Cererê, sob o aspecto do amor à terra, a nossa paisagem rural e humana, reflete o tempo em que vivi na pequena fazenda de meus pais, em Vargem Grande, além do Paraíba e do Buquira. Não poderia eu ter escrito, por exemplo,”Soldados Verdes” e “Florada” sem esse contacto com as coisas da roça que, na adolescência, conheci e amei, em meu município. Ausente da terra de meu nascimento, quanta vez o seu retrato me apareceu na memória com a nitidez dos fatos aqui vividos, com a imagem de todos quantos foram meus amigos, desde a meninice.
Minha poesia, em várias passagens, reproduz S. José dos Campos. Um S. José ainda sossegado, de ruas quietas e hábitos tranquilos. ”Era em S. José dos Campos. E quando caía a ponte (...)”. Este S. José de que falo em meu poema (A flauta que me roubaram) lá se foi com o tempo, com os idos de 1910.
Dois pormenores aí figuram, que desejo explicar: o da ponte sobre o Paraíba, que não raro caía, obrigando o menino, que era eu, a atravessar o rio em balsa, quando vinha do sítio de meus pais à cidade; e o do vizinho que tocava flauta. Quem era ele? Não serei indiscreto em dizer que se tratava de Teodoro Mascarenhas, que foi meu querido colega no quarto ano do grupo escolar e a quem rendo o meu preito de saudade.”(1)
(1)Monteiro, ªM., (2003) Cassiano: fragmentos para uma biografia. 1ª ed., São José dos
Campos: UNIVAP, p.284
Questões
Cassiano Ricardo empregou, em seu poema, alguns recursos linguísticos como meio de auxiliar a expressão de seus sentimentos, memórias e idéias. Tendo em mente as figuras que aprendemos durante o curso, responda as questões a seguir:
1. Em qual estrofe do poema é possível identificar o emprego da elipse? Reescreva o(s) verso(s) em que ocorre(m) tal emprego.
É possível identificarmos em todo o poema o emprego da elipse. Para exemplificar, destacaremos os versos “Havia erro nos votos / mas a soma (dos votos) estava certa.”, na terceira; e “Eu passava o Paraíba / (passava) Numa vagarosa balsa / (passava) Como se dançasse valsa.”
2. Há o emprego de paronomásia ou hiperônimos? Se não houver, desenvolva um parágrafo sobre o que são parônimos e hiperônimos. (De duas a cinco linhas)
Não há palavras parônimas, portanto não há paronomásia. Paronomásia é um efeito de musicalidade aplicado ao som das palavras, como por exemplo, “Berro pelo aterro, pelo desterro”, ou “Meu amor, que sem humor!!”; O verso mais próximo de uma paronomásia seria “Comunismo nem facismo”. No entanto, este efeito é uma rima interna, um eco. Mas posso considerar como certo, pois a ideia essencial da figura está introjetada.
Podemos considerar que os versos “Misto de sabiá e humano / meu vizinho acordava” há relação hiperônímica, pois dentro do campo semântico de “humano” está contida a idéia de “vizinho”. “Humano” é a hiperônimo de “vizinho”; este designamos como hipônimo. Essa figura de linguagem é fundamental para a coesão textual, pois faz a relação de referência entre os versos e o sentido do poema. É um tipo de metonímia.
4. É possível afirmar que há relações antitéticas no poema? Justifique. (Cinco linhas)
Sim, há relações antitéticas no poema. Os primeiros quatro versos da
última estrofe “Havia erros nos votos / Masa soma estava certa. / Deus escrevia direito / Por pequenas ruas tortas” são antíteses que pretendem destacar uma São José, mesmo à época, contraditória moral e politicamente. Na verdade, o segundo e terceiro versos, antitéticos, justificam em Deus um problema político que ocorria no início do século XX: a manipulação dos votos, descritos no primeiro e segundo versos.
5. Faça a escansão da primeira estrofe, compare com as outras, e defina o tipo do poema, segundo a métrica.
E/ra em/ São/ Jo/sé/ dos/ Cam/pos.
E/ quan/do/ ca/í/a a/ pon/te
Eu/ pas/sa/va o/ Pa/ra/í/ba
Nu/ma/ va/ga/ro/sa/ bal/sa
Co/mo/ se/ dan/ças/se/ val/sa.
O poema é composto por sete sílabas métricas (ou poéticas) em cada verso, caracterizando o chamado verso redondilho maior. Comparando com as outras estrofes, todos têm a mesma métrica, ou a mesma contagem de sílabas poéticas. Chamados também de versos em Redondilhas Maiores, como as cantigas de roda.
6 Releia a segunda estrofe do poema e faça um levantamento dos ditongos nasais e dígrafos consonantais. Se não houver ditongos ou dígrafos conforme a questão, defina os dois fenômenos. (De três a cinco linhas)
O levantamento dos dígrafos consonantais (os quais definem-se por serem compostos de duas letras grafadas, emitindo apenas um som) é o seguinte: “manhã” /nh/ no segundo verso; no quarto “caminho” /nh/ e “que”, /qu/ no sexto verso. Dos ditongos nasais (caso de toda nasalização sobre dois sons (vogal átona e tônica)) são os seguintes: “não” /ão/, “manhã” /an/ e /nhã/; e “São” /ão/.
7. Julgue cada uma das afirmações a seguir, relativas ao discurso proferido por Cassiano Ricardo. Indique, no caderno de respostas, apenas V para as verdadeiras e F para as falsas (atenção: como nem todas são verdadeiras nem falsas, você não poderá indicar apenas V ou apenas F, do contrário sua resposta será anulada).
A ( F ) O acento agudo, também indicador de ditongos abertos em palavras como destrói, anéis, chapéu, não foi utilizado nenhuma vez em todo o texto.
B ( V ) O texto não contém nenhum caso de tritongo.
C ( F ) No último parágrafo, nota-se a presença da conjunção subordinativa integrante, de uma coordenativa aditiva e uma conclusiva.
D ( V ) Na frase “Não serei indiscreto em dizer que se tratava de Teodoro Mascarenhas” temos uma conjunção integrante.
E ( V ) No último parágrafo há uma conjunção subordinativa temporal.
8. Sabemos que as preposições são uma classe gramatical cuja função é conectar palavras e orações reduzidas. Algumas delas comportam-se sempre como preposições; já outras, podem se comportar como conjunções, isto é, conectanto orações subordinadas e coordenadas. Os dois tipos são conectivos: apenas mudam sua função do nível morfológico para o sintático. Dê um exemplo de quando essa troca de funções pode ocorrer, indicando o tipo da conjunção. (De três linhas a cinco linhas)
Podemos fazer a preposição “e”, por exemplo, funcionar como conjunção coordenada aditiva. Em “Pedro e Maria são felizes” o “e” tem função de preposição, conectando dois substantivos. Já em “Pedro é feliz e Maria também o é” o “e” torna-se uma conjunção aditiva, unindo duas orações coordenadas. É possível que uma preposição acompanhe uma conjunção também, formando a locução conjuntiva. “Até que”, “por meio de”, “de forma que”, "Para que" entre outras locuções.
8. (Univ. Fed. Santa Maria – RS) – Assinale a sequência de conjunções que estabelecem, entre as orações de cada item, uma correta relação de sentido. A seguir, classifique as conjunções escolhindas conforme suas funções nas orações:
a. Correu demais, por isso caiu.
b. Dormiu mal, porque os sonhos não o deixaram em paz.
c. A matéria perece, mas a alma é imortal.
d. Leu o livro, portanto é capaz de descrever as personagens com detalhes.
e. Guarde seus pertences, que podem servir mais tarde.
A ( ) porque, todavia, portanto, logo, entretanto
B (X) por isso, porque, mas, portanto, que
C ( ) logo, porém, pois, porque, mas
D ( ) porém, pois, logo, todavia, porque
E ( ) entretanto, que, porque, pois, portanto
A sequência mais adequada para o uso dos conectivos acima são todas conjunções coordenativas: “por isso” é uma conjunção conclusiva; “porque” é conjunção explicativa; “mas”, conjunção adversativa; “portanto” tem função conclusiva e “que” é uma explicativa.
9. O poema e o texto em prosa, ambos do poeta, crítico e ensaísta joseense, tratam, em um nível mais profundo, de um mesmo tema, embora o que esteja em prosa (o discurso) tenha a função de referir ao poema, contextualizando-o sob certo aspecto. Quais são as diferenças fundamentais entre cada texto?
Sob o ponto de vista da forma, o primeiro trata-se de um poema com métricas regulares; são, inclusive, redondilhos maiores, o que o caracteriza como um poema musicalizado; há rimas e figuras de linguagem, como elipses e hiperônimos.
O segundo é um texto em prosa, com organização de parágrafos e sem preocupação poética. Tem função metalinguística, isto é, um texto que fala sobre outro texto (no caso, um livro, “Martim Cererê” e um poema, “A flauta que me roubaram”). Além disso é um “discurso”, como a própria questão se refere.
Pelo conteúdo, no discurso de Cassiano Ricardo, há claramente uma intenção textual de se falar sobre as imagens e memórias dos tempos passados de uma “São José dos Campos”; sobre o “contacto” com a natureza e a roça; e que sem essa experiência, como poderia ter pensado em “Soldados Verdes” e “Florada”; fala sobre onde o poeta vivia quando menino, seus amigos de escola e infância. Diz sobre a experiência e memória que motivou a criação de seus textos; ou que, pelo menos, o ajudaram a compô-los.
Já o poema fala da memória sobre uma São José dos Campos longínqua, misturando lembranças de infância e juventude, e utilizando-se de recursos literários para aproximar o conteúdo da forma de expressão: o fato de usar redondilhas maiores aproxima à ideia de um tempo de menino, tempo de cantigas de roda, para resumir. Essa questão é de livre interpretação, mas teria de “rodear”, ao menos, as ideias que expus acima, com um texto apresentável e coeso. Evidentemente não seria necessário escrever muito, mas apenas destacar o que poderia ser importante, fundamental. O mesmo se aplica à questão dez.
10. Discorra, livremente, sobre as semelhanças entre os textos; e faça as devidas citações com uso adequado de aspas.
A ideia fundamental é mais ou menos o que expomos na resposta da nove, mas falando sobre as semelhanças: ambos os textos falam de e sobre São José dos Campos. No poema está bastante caracterizada essa proposta, pois o eu lírico tem a preocupação de expressar essas imagens de infância e adolescência dessa “São José” por meio de uma musicalidade (infantil) que também aparece em cantigas de rodas (típico nas brincadeiras de crianças): os versos redondilhos maiores. “Batatinha quando nasce” e “Vamos todos cirandar” também são redondilhos maiores e entoam as lembranças (musicais) produzidas pelo poema. Todo o poema é uma memória musical, desde a “flauta” do título e dos versos finais até a própria estrutura do poema. O uso dos verbos no passado Imperfeito remetem a um tempo mítico, remoto, mas que está presente na memória. “Era em São José dos Campos”, "era uma vez..."
O texto em prosa fala de como a experiência e mémoria de São José dos Campos interferiram na criação de seus textos. O primeiro parágrafo fala dessa experiência na produção de “Martim Cererê”, obra que o consagra como autor modernista; o segundo, da sua produção poética e, especificamente, da memória no poema “A flauta que me roubaram”. O terceiro parágrafo explica “dois pormenores” que configuram o poema: na primeira estrofe, o fato da ponte cair com certa constância que “o obrigava, menino” a atravessar o rio Paraíba de balsa; e no final da última estrofe, onde ele explica quem tocava a “a flauta” que é, enfim, também o título do poema. "A flauta que me roubaram" também pode ser a infância perdida (ou passada) do autor?
Como disse, esta também é uma questão de interpretação, na qual minha preocupação "avaliativa" é sobre a apresentação textual e a organização dos conteúdos expressos, independente de quais sejam, mas que everiam ser, pelo menos aproximadamente, sobre o que referi logo atrás.